Newsletter Direto de Paris #9

Newsletter 9
A Place du Tertre, em Montmartre

 

Olá! Espero que você esteja bem! Aqui vai a nossa nona edição da Newsletter do Direto de Paris. Se você recebeu o email com o link para o texto dela, é porque se cadastrou para recebê-la. Caso tenha mudado de ideia e queira sair da lista, é só me escrever no contato@diretodeparis.com , que eu tiro seu endereço de email sem problemas. Coloque o assunto porque senão vai para a caixa de spam. Se quiser ler as outras edições da Newsletter, basta clicar aqui.

Outubro é o mês mais bonito do ano! Bem pessoal esta frase, né? É que é o mês do meu aniversário. Comemorar aniversário morando fora é mais um aspecto de estar sempre entre dois países. Por mais que a gente tenha feito uma nova família ou amigos por aqui, sempre pensamos em quem ficou no nosso país natal. No meu caso, minha mãe. Por isso, sempre passo o aniversário dela no Brasil, que é em janeiro. Então, fiz desta edição da Newsletter um presente para mim e para você também. Em outubro em Paris tem uma festa bem legal que é a Fête des Vendanges, em Montmartre. É a única “festa da colheita” aqui em Paris e por esta razão que ela é especial para muita gente na cidade. Vou dar mais detalhes agora, logo abaixo.

 

Outubro celebra o vinho em Paris

 

Historicamente, as festas das “vendanges” (colheita) são organizadas quando acaba a proibição de colher as uvas. Assim, os viticultores e outras pessoas que vão participar da colheita estão prontos para começar. E, normalmente, assim que ela acaba acontece a festa, como uma celebração pelo resultado final dessa colheita do ano.

A região parisiense, que compreende Paris e os arredores, possui algumas vinhas. Nos arredores, temos a de Suresnes, uma cidade a 10 km de Paris; de Argenteuil, a 12 km da capital, de Sucy-en-Brie, situada a 19 km, só para citar algumas. Já na Cidade Luz, tem uma bem pequena no Parc de Bercy, mas a mais famosa delas é a de Montmartre.

Se você já veio a Paris e passeou em Montmartre, deve ter passado por ela. E quando a vemos, é impossível não se questionar sobre o que é aquele terreno e o porquê de existir uma vinha ali. E, apesar de pequena, ela não está no lugar para enfeite: suas uvas são a origem do Clos-Montmartre, um vinho de pequena produção e caro, que é o motivo da festa agora em outubro. Se você quiser saber mais sobre a vinha de Montmartre e o vinho produzido por ela, veja este texto bem completo sobre o Clos-Montmartre.

 

Clos Montmartre
A vinha de Montmartre

 

Agora vamos à festa. Este ano, a Fête des Vendanges de Montmartre acontece do 5 ao 9 de outubro e será a sua 89a edição. A primeira festa ali aconteceu em 1934 e se restringia aos arredores da vinha. Hoje, todos os oito bairros do 18o distrito de Paris participam do evento. É tanta coisa para fazer, que é difícil escolher.

Há visitas guiadas da vinha de Montmartre, do Moulin Rouge, dos bairros que fazem parte da festa. Há também música, dança, teatro, leituras de obras literárias, exposições, palestras, tanto para adultos quanto para as crianças. Sem contar o lado enogastronômico, afinal o evento é para isso. Na parte alta, a Butte Montmartre, há uma feira da qual participam este ano cerca de 150 produtores de vinhos, de outros tipos de bebidas e de produtos típicos, não só da França, mas também de outros países. E os restaurantes do bairro e arredores têm menus especiais.

 

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Os eventos-chave da Fête de Vendanges são o Ban des Vendanges, quando os grupos folclóricos e confrarias se reúnem na vinha para o “ban”. Ban em francês é banimento (ou aqui podemos traduzir por proibição). Então, no evento, é o final simbólico da proibição de colher as uvas. É uma cerimônia bem interessante de se ver: o presidente da République de Montmartre (uma associação) colhe um cacho de uva. E todos os grupos cantam a música tema do ano. A desta edição é “Né quelque part”, composta por Maxime Le Forestier e Jean-Pierre Sabar.

Logo em seguida, às 11h45, tem o desfile das confrarias e grupos tradicionais, não só da França como de outros países também. E todos com suas roupas típicas. Além deles, participam as associações dos bairros, os moradores de Paris e até os turistas.  No ano passado, o cortejo teve 1300 pessoas. É um festival de cor, que mostra o porquê do 18o distrito ser um lugar tão cosmopolita. E que vai bem com o tema deste ano: L’égalité (igualdade em francês). Se você quiser conhecer melhor a festa, veja aqui no blog esta matéria sobre a  Fête des Vendanges de Montmartre. E consulte também o site oficial do evento.

 

Fête des Vendanges de Montmartre
Uma das confrarias de vinho da França

 

Para quem gosta de cinema!

 

O Orgulho (Le Brio)
Ano de estreia: 2017.
Direção: Yvan Attal.
Onde assistir: VivoPlay

 

Vi este filme no cinema, revi recentemente e foi um dos que mais gostei. Ele trata, com um humor sutil, uma questão que é séria aqui na França: as dificuldades de integração de imigrantes e seus descendentes, tendo como pano de fundo o sistema de ensino superior no país. Neila Salah é uma jovem de ascendência árabe e que vive na periferia de Paris. Ela entra para a faculdade de Direito de uma universidade tradicional e tem que enfrentar um professor preconceituoso que é seu tutor para um concurso.

As interpretações são muito boas, principalmente a de Daniel Auteuil, um dos melhores atores do cinema francês da atualidade. Fiquei com saudade dos meus tempos de faculdade aqui na França, embora não tenha enfrentado as dificuldades de Neila. Também vi este filme disponível na Claro TV, Google Play e Youtube.

 

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Personagem

Alexandra David-Néel – Uma vida de coragem e aventura

 

Quem gosta de narrativas de viagens, não pode deixar de ler Alexandra David-Neel. Esta francesa foi pioneira na visita ao Tibete e também percorreu vários outros lugares na Ásia. Foi uma das exploradoras mais fascinantes da História, escreveu mais de vinte livros, entre narrativas de viagem e obras sobre o Budismo, e viveu cem anos. Vamos mergulhar um pouco na vida dessa mulher incrível e corajosa.

Louise Eugénie Alexandrine Marie David nasceu em outubro de 1868 na cidade de Saint-Mandé, na periferia de Paris. Sua mãe desejava um menino, que nasceria cinco anos depois, mas morreria ainda bebê. Por isso, desde criança, Alexandra conviveu com uma mãe depressiva e talvez ausente. A primeira “aventura” da pequena exploradora começa cedo: aos cinco anos, foge para o Bois de Vincennes, uma grande área verde (até hoje é extensa) ali perto de onde morava. Depois de horas, ela é encontrada por um policial, que a leva até seus pais. 

Mas a “carreira de fugitiva” não para por aí. Quando tinha 15 anos, durante as férias em Ostende, na Bélgica, Alexandra vai até o porto de Flessingue, ali perto na Holanda, e tenta partir para a Inglaterra. Porém, suas magras economias impedem a viagem e ela é obrigada a voltar para a família, que nesta época morava na Bélgica. Com 20 anos, se torna cantora lírica profissional, com o nome artístico de Alexandra Myrial. Na mesma época, entra em contato com as ideias anarquistas e feministas, participando de várias reuniões.

 

Alexandra David-Néel
Alexandra, aos 30 anos, vestida como Mireille, para a ópera de mesmo nome – Domínio Público

 

Aos 21 anos, Alexandra descobre o Musée Guimet, recém-inaugurado em Paris, especializado em cultura oriental. É ali também que a futura exploradora conhece e se apaixona pelo Budismo. Ela começa a aprender o sânscrito e a língua tibetana. Ainda com 21 anos, ela recebe seu primeiro prêmio como cantora de ópera.

Em 1894, ela parte pela primeira vez para a Índia. Seu amor pelo continente asiático só aumenta. Sua carreira de cantora possibilita que ela conheça vários lugares da Europa e da Ásia. E é em Túnis, aos 30 anos, que ela encontra Philippe Néel. No começo, Alexandra resistia às investidas do pretendente. Feminista, ela não queria perder sua liberdade e ficar sob a tutela de um homem. Depois de muita insistência, ela aceita se casar com Philippe, mas com algumas condições: não cuidar da casa e nem receber os amigos do marido, não ter filhos, continuar trabalhando. Para Alexandra, a independência financeira da mulher era fundamental. Eles se casam em 1904.

Porém, nem o casamento é capaz de deter esta mulher fora do comum. Em 1911, Alexandra David-Néel decide partir sozinha para a Ásia para estudar o Budismo. A viagem, que deveria ser de oito meses, dura catorze anos! E Philippe é um marido excepcional para a época – e hoje seria também -, pois até encoraja a esposa em suas aventuras. Durante os anos de casamento, eles ficam mais tempo longe do que juntos e trocam mais de 3 mil cartas.

Em 1912, Alexandra encontra o 13o Dalai-Lama. E visita os lugares mais isolados da Ásia. Um deles é o estado de Sikkim, nas montanhas do Himalaia. Ali, ela chega a passar vários meses em uma caverna a 4 mil metros de altitude. Sua coragem passa a ser assunto nos monastérios da região.

 

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Alexandra com a roupa que usou para entrar no Tibete

 

 

Em 1914, ela encontra um jovem lama, Aphur Yongden, que se torna seu discípulo. Dois anos depois, os dois entram ilegalmente pela fronteira do Tibete. Seguem viagens pela Birmânia (Myanmar), Japão, Coreia e China. Em 1918, ela se instala no monastério de Kum Bum, na China, durante dois anos e meio. E não para por aí! Com 55 anos, em 1923, ela se disfarça de mendiga e percorre, com Yongden, todo o Tibete. Alguns meses depois, ela chega mesmo a entrar na cidade proibida de Lhasa. Um feito inédito. 

De volta à França, ela publica, em 1927, seu best-seller Voyage d’une Parisienne à Lhasa (Viagem de uma Parisiense a Lhasa, em tradução livre). Ela se torna uma celebridade e dá várias palestras pelo país. No ano seguinte, compra um terreno em Digne-les-Bains, no sudeste da França. Ela vai reformar e aumentar a construção que já estava ali, dando-lhe o nome de Samten Dzong. E também adota Yongden sozinha.

E você pensa que ela se aposentou? Não! Aos 69 anos, Alexandra parte de novo para a Ásia com o trem Transiberiano. E, por causa da Segunda Guerra Mundial, fica por 10 anos bloqueada na China. Durante este tempo, em 1941, Philippe morre e ela não pode ir ao enterro do marido. Ela só consegue voltar para a França em 1946, em um avião militar. 

Aos 96 anos, Alexandra é homenageada pelo governo francês e se torna comendadora da Legião de Honra. Ela passa na França os anos finais de vida e morre, em 8 de setembro de 1969, na sua casa em Digne, com quase cem anos, após uma vida repleta de aventuras de fazer inveja até hoje. Podemos encontrar vários livros de Alexandra David-Néel no Brasil. Na França, a casa de Digne-le-Bains virou um museu aberto ao público. 

 

Tibetana
Alexandra David-Néel com traje típico tibetano, 1933, crédito: Preus Museum, Noruega

 

Para Passear

Maison Alexandra David-Neel – Digne-les-Bains – Provence-Alpes-Côte d’Azur

 

Este é o único bem que Alexandra comprou em toda a sua vida. Logo que adquiriu a propriedade, ela a reformou e a batizou como Samten Dzong, que significa residência de reflexão. E o nome vem bem a calhar, pois foi aqui que a escritora e exploradora redigiu parte de suas obras, principalmente no final da vida. A própria residência tem o toque de sua proprietária, pois ela escolheu pessoalmente os materiais e decoração que hoje vemos no lugar. Inclusive, várias árvores que Alexandra plantou são visíveis pelo terreno, como ciprestes e tílias. O belo jardim, com flores, legumes e árvores frutíferas, leva o nome de seu discípulo e filho adotivo, Yongden, que morreu antes dela, em 1955.  Hoje, a visita é composta por duas partes: a vila, com o jardim, e o museu. E depois de visitar Alexandra, vale a pena passear pelas ruas de Digne-les-Bains, uma bela cidade que tem montanhas, lagos, termas e lavanda. Para saber mais sobre a casa de Alexandra David-Néel, consulte o site oficial.

 

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A cidade de Digne-les-Bains

 

Château de Vincennes – Vincennes – Île-de-France

 

 

Château

 

Um castelo magnífico às portas de Paris, o Château de Vincennes tem uma história bem longa. Construído na Idade Média e reformado no século XVII, no reinado de Louis XIV, a construção não perdeu seu aspecto imponente e defensivo. Sua história se mistura com a da França. Foi residência de reis e teve um papel chave na Guerra dos Cem Anos. A rainha Isabeau de Bavière não reconhecia o próprio filho, o futuro Charles VII, como herdeiro do trono francês. Então, ela se alia à Inglaterra e promete a Coroa ao rei inglês Henry V, que havia se casado com a filha de Isabeau, Catherine. Henry, então, vem à França em vias de tomar posse de “seu território” como regente e futuro soberano, pois o rei francês Charles VI estava louco e com a saúde deteriorada. O que ninguém esperava é que Henry iria morrer no Château de Vincennes, em 1422, com apenas 35 anos, dois meses antes que o rei da França. Foi um golpe duro para os ingleses, que, tempos depois, perdem a guerra.

O castelo não é mobiliado, para ser fiel à época em que foi construído. Sua torre principal, Donjon, é impressionante e serviu de prisão. Vemos até inscrições na parede dos antigos prisioneiros. Um deles foi o marquês de Sade. A capela também é uma obra de arte. O Château também acolhe exposições temporárias e vários eventos. Depois de visitá-lo, pode-se esticar o passeio conhecendo a cidade de Vincennes, bem charmosa e com bela arquitetura. Também é possível ir até Saint-Mandé, outra bela cidade, onde nasceu Alexandra David-Néel, ou flanar pelo Parc Floral, ali do lado do castelo, que é belo em qualquer estação. Para saber mais, veja o post que fiz sobre o Château de Vincennes.

 

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O exterior da capela do castelo

 

Alguns eventos interessantes pela França

 

Apesar de estarmos já em outubro, os eventos aqui na França continuam. Separei três dos que achei mais interessante e que quem estiver por aqui pode aproveitar:

 

1) Journées Nationales de l’Architecture – Toda a França

O evento não é somente para quem gosta de arquitetura, mas para todo mundo. Este ano é a 7a edição e o tema é Architectures à Habiter (Arquiteturas para Morar, em tradução livre). Durante todo um final de semana, museus, monumentos e muitos outros lugares oferecem uma programação variada que vai de ateliês para crianças e adultos e até visitas guiadas e a maioria das atrações é de graça. De 14 a 16 de outubro. Mais informações aqui

 

Journée Architectures

 

2) Nuit des Châteaux – Toda a França

Este evento é relativamente novo, está somente na 4a edição. Durante uma noite de sábado (e de domingo para alguns lugares), vários castelos privados abrem excepcionalmente com uma rica programação. Há concertos musicais, visitas guiadas simples ou teatralizadas, jantares e muito mais. As tarifas variam conforme o castelo. Sábado, 22 de outubro (alguns castelos terão eventos no dia 23 também). Para mais informações, acesse o site do evento

 

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3) Jazz entre les Deux Tours – La Rochelle – Nouvelle-Aquitaine

Uma ótima ocasião para quem quer visitar uma cidade linda, La Rochelle, e ainda escutar boa música. E não só isso! Na sua 25a edição, o festival tem um programa super rico que dura cinco dias. Além dos concertos, gratuitos e pagos, há jantares, exposições de fotos, animações, palestras, tudo contemplando as diferentes correntes do jazz. É a ocasião de encontrar nomes internacionais, mas também os artistas locais e as revelações do estilo. De 11 a 15 de outubro. Mais informações, veja o site oficial

 

Jazz la Rochelle

 

E, assim, termino mais uma edição da Newsletter. Espero que tenha gostado desta nona edição. Se você tiver sugestões, coloque aqui nos comentários ou escreva para contato@diretodeparis.com, colocando o assunto no email. Suas ideias vão me ajudar a fazer uma Newsletter ainda melhor.

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Renata Rocha Inforzato

Sou de São Paulo, e moro em Paris desde 2010. Sou jornalista, formada pela Cásper Líbero. Aqui na França, me formei em História da Arte e Arqueologia na Université Paris X. Trabalho em todas essas áreas e também faço tradução, mas meu projeto mais importante é o Direto de Paris. Amo viajar, escrever, conhecer pessoas e ouvir histórias. Ah, e também sou louca por livros e animais.

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